Religião é uma forma
de religar. Religa partes, une pontas e diminui distâncias. O sacramento
está sempre unido a um símbolo justamente por isso, pois ele é uma
forma de concretizar a natureza da religião. Ele é a parte humana que se
estende em direção a Deus com o intuito de tocá-lo e experimentá-lo. O
símbolo é uma forma de prazer e o sacramento também, pois nele o
sacrifício está redimensionado, já tem cores de ressurreição. A pergunta O menino chegou e
perguntou-me: "Padre, eu sou obrigado ir à missa?". Olhei seus olhos e
percebi uma honestidade na questão formulada. Junto da honestidade,
havia uma ansiedade que lhe impedia o sorriso. No rosto, não havia
alegria. Estava tomado de uma certeza de que a liturgia católica, para
ele, estava longe de ser um acontecimento que lhe extraia gratuidade.
Era uma obrigação a ser cumprida. Sua voz parecia me pedir socorro, feito escravo com sua carta de alforria em mãos, a me pedir assinatura. Naquele momento,
fiquei sem palavras. Senti o coração apertado no peito e o desejo de
nada responder. Reportei-me à Escritura Sagrada e senti-me como o
próprio Abraão, diante do questionamento de Isaac: "Pai, onde está a
vítima do sacrifício?" (Gn 22, 7). Pergunta que não tem resposta.
Pergunta cheia de ansiedade, de silêncio, de motivos, honesta e plena de
razões. Olhei-o com muita
firmeza e resolvi desafiá-lo: "É obrigado visitar alguém a quem se
ama?". Ele disse: "Não, não é não, padre". Seguiu-se o silêncio.
Calou-se ele, e eu também. A pergunta que não cala Algumas horas depois,
retomei sua pergunta e fiquei pensando nela. Coloquei-me a pensar na
religião que se apresenta ao coração humano como obrigação a se cumprir,
feito mochila pesada que se leva nas costas. Fico pensando no
quanto a obrigação pode se opor ao prazer. E o quanto é contraditório
fazer a religião ser o local da obrigação. Na expressão: "Deus é amor"
(1Jo 4, 8), definição que João nos apresenta em sua carta, está a
declaração da gratuidade de Deus. Deus é o próprio ato
de amar. Ele é o amor acontecendo, e a liturgia é a atualização dessa
verdade na vida das pessoas. Ir à missa é tomar posse da parte que nos
cabe. Tudo o que ali se
celebra e se realiza tem o único objetivo de nos lembrar que há um Deus
que se importa conosco, que nos ama e quer nos ver mais de perto. O
sacramento nos aproxima de Deus. Tudo bem, essa é a Teologia, mas e a vida, corresponde à verdade teológica? Nem sempre. Nosso
rito, por vezes, cansa mais do que descansa. É lamentável que a
declaração de amor de Deus por nós tenha se tornado uma obrigação. Sou obrigado a ouvir alguém dizer que me ama? Se muita gente pensa
assim, é porque não temos conseguido "amorizar" a celebração.
Racionalizamos o recado de Deus e o reduzimos a uma informação fria e
calculada. Dizemos: "Deus nos ama!", da mesma forma como informamos: "A
cantina estará funcionando depois da missa!". A resposta que responde perguntando Pudera eu ter uma
solução! Ou quem sabe uma resposta que aliviasse os corações que se
sentem obrigados a conhecer o amor de Deus, como o coração daquele
menino. Talvez, o teu coração
também já tenha experimentado essa angústia e essa ansiedade. Gostaria
de saber restituir o sabor lúdico das celebrações católicas. Torná-las
acontecimentos reveladores, palavras para não serem esquecidas e imagens
que despertassem o coração humano para o desejo de descansar ali todas
as questões existenciais que o perturbam. O problema não está no conteúdo do que celebramos, mas, sim, na forma. A natureza simbólica
da vida é o lugar do encanto. Por isso, a celebração é cheia de
símbolos. Mas o símbolo, se explicado, deixa de ser símbolo, perde a
graça e deixa de comunicar. Talvez seja isso o que tem acontecido
conosco. Na ansiedade de sermos eficientes, tornamos a celebração um
local de comunicar recados. Falamos, falamos, de maneira ansiosa,
cansada e repetitiva. Temos que falar algo, pois também o padre tem a
sua obrigação! E assim vamos
celebrando, obrigando o coração e os sentidos a uma espécie de ritual
que nos alivia a consciência, mas não nos alivia a existência. A missa é muito mais
do que uma obrigação: é um encontro. Encontro de partes que se amam e se
complementam. É só abrir os olhos e perceber! Creio que possa ser diferente.
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